resumo por Alaya Dullius
Karen King, em seu livro What is Gnosticism? (2003) apresenta uma magnifica argumentação a respeito das
rotulações do gnosticismo e do cristianismo que aqui sumarizamos: Ela afirma
(p. 15) que definições são limitadas, e só servem para chamar atenção a
respeito de certas características de um fenômeno, ignorando outras
características. King critica o uso definitivo do termo ‘gnosticismo’, tratado
como entidade histórica e não como categoria de definição. O termo só passou a
ser usado recentemente, e faz mais sentido falar de ‘gnósticos’ do que de uma
doutrina especifica e fechada, pois tal não existiu.
King aponta (p. 17) para uma tendência de objetificar o passado e nos lembra que “não havia nenhum hierarquia episcopal universalmente reconhecida, nem nenhum credo em comum, ou cânone neo-testamentário nos primeiros séculos.” (p. 23) A patrística, já no século II d.C., no processo de confrontar as heresias, ganhou uma visão mais firme e definida de si mesma como ortodoxia (p. 25), porém é preciso entender que chamar outros de heréticos é apenas uma forma de segregar um grupo, e não significa necessariamente uma ‘opinião correta’. “A maioria dos elementos que hoje consideramos fundamentais para o pensamento e prática Cristãs, mais especificamente o cânone e o credo, eram ausentes no Cristianismo primitivo” (p. 25).
Portanto não deveríamos ler a evidência do passado apenas através da perspectiva tingida, o ‘gnosticismo’ (que não é um ‘ismo’) não deve ser definido em relação ao cristianismo normativo, como se um tivesse surgido antes do outro. Não pode ser chamado de ‘heresia cristã’, pois isto já parte de uma premissa que leva em conta o rótulo dado pelo grupo dominante. Clemente de Alexandria, por exemplo “usava o termo ‘gnóstico’ para se referir a cristãos que avançaram bastante em seu entendimento espiritual. (p. 26). Não se pode falar de um ‘gnosticismo dualista’, ou que os gnósticos possuem uma visão negativa do mundo e são amorais, pois isto seria levar em conta apenas a visão heresiológica e parcial sobre eles e “os retratos da heresia feitos pelos polemistas seriamente distorciam a visão a respeito de seus oponentes” (p. 27).
A criação da heresia foi apenas parte do projeto de formação da identidade cristã. “Os cristãos também tinham que criar categorias que os distinguissem de outros. O resultado são as categorias muito bem conhecidas: Cristianismo, Judaismo e Paganismo. Porém a validade dessas categorias não é tão auto-evidente quanto o seu amplo e divulgado uso parece implicar” (p. 38). Jonas defende a unidade do gnosticismo baseada não nas doutrinas, mas na ‘atitude existencial’. Harnack descreve o gnosticismo como “uma aguda helenização do cristianismo”, e novamente a definição da gnosis fica em dependência de um cristianismo que não existe como unidade definida. Reitzenstein, diz King (p. 89), vai buscar uma origem Mandeana-gnóstica para Jesus, e foi buscar a origem da expressão ‘Filho do Homem’ em fontes persas.
Outros se dirigiram a fontes judaicas. É preciso entender, considera King (p. 68) que o gnosticismo não é uma entidade viva, mas apenas uma ferramenta retóricas que trabalhou para produzir uma versão normativa de cristianismo. É por demais superficial procurar entender o cristianismo apenas através de duas categorias (ortodoxia e heresia), “ele é muito mais multiforme” (p. 115). Portanto falamos de cristianismo gnóstico, judaismo gnóstico, valentinianismo cristão, cristianismo tomista, catolicismo, etc. E ainda assim não podemos dizer o quão gnóstico, o quão cristão, o quão judeu ou helênico, alguma dessas ‘categorias’ de fato é. “Dado o caráter sincrético e volátil da literatura religiosa e filosófica no antigo mundo Mediterrâneo, é inútil insistir que certos textos pertençam a uma (e apenas uma) tradição” (p. 169).
O cristianismo normativo não deve ser o fator central para definir o gnosticismo, inclusive, dada a artificialidade desse rótulo “cristianismo”, e dado o fato de sua definição ser totalmente dependente das disputas pela hegemonia “cristã” nos primeiros séculos, poderiamos inclusive afirmar que é o gnosticismo que representa de forma mais aproximada o ensinamento que o “possível Jesus” tenha transmitido, mais do que a própria doutrina eclesiástica; diriamos então que o gnosticismo é muito mais “cristão”, e o cristianismo muito mais “herético”. Assim, o “Gnosticismo pode ser uma opção teológica legitima para a prática e crença cristã” (p. 173).
A tradição de Jesus gerou uma variedade de respostas, e nem todas elas tornaram-se “ortodoxas”. (p. 228) Portanto, é preciso “repensar a conjetura de que a verdade (‘ortodoxia’) é caracterizada por unidade, uniformidade, unanimidade; e a falsidade (‘heresia’), por divisão, diversidade” ( p. 229), pois “religiões não sao entidades fixas com uma determinada essência ou momento decisivo de pura originação. São construções que requerem trabalho, diálogo, abertura de fronteiras para outras tradições” (p. 230). Portanto não podemos dividir ‘gnosticismo’ e ‘cristianismo’ como se fossem simplesmente duas coisas certas e decididamente distintas. Podemos falar em variedades de cristianismo e gnosis.
King aponta (p. 17) para uma tendência de objetificar o passado e nos lembra que “não havia nenhum hierarquia episcopal universalmente reconhecida, nem nenhum credo em comum, ou cânone neo-testamentário nos primeiros séculos.” (p. 23) A patrística, já no século II d.C., no processo de confrontar as heresias, ganhou uma visão mais firme e definida de si mesma como ortodoxia (p. 25), porém é preciso entender que chamar outros de heréticos é apenas uma forma de segregar um grupo, e não significa necessariamente uma ‘opinião correta’. “A maioria dos elementos que hoje consideramos fundamentais para o pensamento e prática Cristãs, mais especificamente o cânone e o credo, eram ausentes no Cristianismo primitivo” (p. 25).
Portanto não deveríamos ler a evidência do passado apenas através da perspectiva tingida, o ‘gnosticismo’ (que não é um ‘ismo’) não deve ser definido em relação ao cristianismo normativo, como se um tivesse surgido antes do outro. Não pode ser chamado de ‘heresia cristã’, pois isto já parte de uma premissa que leva em conta o rótulo dado pelo grupo dominante. Clemente de Alexandria, por exemplo “usava o termo ‘gnóstico’ para se referir a cristãos que avançaram bastante em seu entendimento espiritual. (p. 26). Não se pode falar de um ‘gnosticismo dualista’, ou que os gnósticos possuem uma visão negativa do mundo e são amorais, pois isto seria levar em conta apenas a visão heresiológica e parcial sobre eles e “os retratos da heresia feitos pelos polemistas seriamente distorciam a visão a respeito de seus oponentes” (p. 27).
A criação da heresia foi apenas parte do projeto de formação da identidade cristã. “Os cristãos também tinham que criar categorias que os distinguissem de outros. O resultado são as categorias muito bem conhecidas: Cristianismo, Judaismo e Paganismo. Porém a validade dessas categorias não é tão auto-evidente quanto o seu amplo e divulgado uso parece implicar” (p. 38). Jonas defende a unidade do gnosticismo baseada não nas doutrinas, mas na ‘atitude existencial’. Harnack descreve o gnosticismo como “uma aguda helenização do cristianismo”, e novamente a definição da gnosis fica em dependência de um cristianismo que não existe como unidade definida. Reitzenstein, diz King (p. 89), vai buscar uma origem Mandeana-gnóstica para Jesus, e foi buscar a origem da expressão ‘Filho do Homem’ em fontes persas.
Outros se dirigiram a fontes judaicas. É preciso entender, considera King (p. 68) que o gnosticismo não é uma entidade viva, mas apenas uma ferramenta retóricas que trabalhou para produzir uma versão normativa de cristianismo. É por demais superficial procurar entender o cristianismo apenas através de duas categorias (ortodoxia e heresia), “ele é muito mais multiforme” (p. 115). Portanto falamos de cristianismo gnóstico, judaismo gnóstico, valentinianismo cristão, cristianismo tomista, catolicismo, etc. E ainda assim não podemos dizer o quão gnóstico, o quão cristão, o quão judeu ou helênico, alguma dessas ‘categorias’ de fato é. “Dado o caráter sincrético e volátil da literatura religiosa e filosófica no antigo mundo Mediterrâneo, é inútil insistir que certos textos pertençam a uma (e apenas uma) tradição” (p. 169).
O cristianismo normativo não deve ser o fator central para definir o gnosticismo, inclusive, dada a artificialidade desse rótulo “cristianismo”, e dado o fato de sua definição ser totalmente dependente das disputas pela hegemonia “cristã” nos primeiros séculos, poderiamos inclusive afirmar que é o gnosticismo que representa de forma mais aproximada o ensinamento que o “possível Jesus” tenha transmitido, mais do que a própria doutrina eclesiástica; diriamos então que o gnosticismo é muito mais “cristão”, e o cristianismo muito mais “herético”. Assim, o “Gnosticismo pode ser uma opção teológica legitima para a prática e crença cristã” (p. 173).
A tradição de Jesus gerou uma variedade de respostas, e nem todas elas tornaram-se “ortodoxas”. (p. 228) Portanto, é preciso “repensar a conjetura de que a verdade (‘ortodoxia’) é caracterizada por unidade, uniformidade, unanimidade; e a falsidade (‘heresia’), por divisão, diversidade” ( p. 229), pois “religiões não sao entidades fixas com uma determinada essência ou momento decisivo de pura originação. São construções que requerem trabalho, diálogo, abertura de fronteiras para outras tradições” (p. 230). Portanto não podemos dividir ‘gnosticismo’ e ‘cristianismo’ como se fossem simplesmente duas coisas certas e decididamente distintas. Podemos falar em variedades de cristianismo e gnosis.
Parabéns, pelos estudos e discernimento. estudo Gnosis há 15 anos, e é muito difícil encontrar conceitos claros sobre gnosticismo.
ResponderExcluirAssisti seu vídeo sobre gnosticismo, tá muito bom
A conclusão final do gnosticismo é fatalmente o agnosticismo. O indizível não é possível ser expresso em palavras. No máximo, podemos nos aproximar...
ResponderExcluirbom dia...moro no interior de Mao Grosso do sul, cidade de Bonito. o que quero lembrar aqui é que achei muito interessante o resumo de Karen King. Tenho um conhecimento espiritual ou psíquico em que a linha que tenho vivido e me apresentado me traz um histórico no meu entendimento muito próximo ao conhecimento gnóstico. para isso já recorri todos os textos gnósticos possíveis e sou fascinado por eles. Por último escrevi um livro com o título: QUEM FOI JESUS? QUEM FOI CRISTO? (a editar)este livro é a partir de uma interpretação esotérica da Bíblia, porquanto vejo que bíblia atual saiu de uma fonte esotérica mas é apresentada ao público "leigo" exotericamente.Concluindo, me parece que conhecimento gnóstico é um despertar interior em que todo o ser ao elevar-se, o alcança. como gosto muito de poesias, as vezes arrisco em escrever. vou apresentar esta com o título: GNOSIS. GNOSES
ResponderExcluirDeus e conhecimento,
Se diferem um pouco da fé
O conhecimento ensina e fica
A fé em certo tempo termina;
No conhecimento,
Deus é o meu abrigo
Na fé,
Deus pode ser meu castigo;
No conhecimento,
Encontro o reino aqui e agora
Na fé,
Tenho que deixar a terra
e ir embora;
No conhecimento,
Deus é e está em Amor
Se eu compartilho com Ele
Sinto-O em meu interior;
No conhecimento,
Jesus é filho, e é primogênito,
O Cristo também é Filho,
Mas é o unigênito;
No conhecimento,
Jesus recebeu o Cristo,
Cristo é o Filho de Deus
E como o Pai, nunca foi visto;
No conhecimento,
O Cristo se fez carne em Amor
E como Filho de Deus
Se fez espírito em nosso interior;
No conhecimento,
Cristo não tirou o pecado do mundo
Ensinou a nos redimir
Nos olhando bem lá no fundo;
No conhecimento,
O Reino está em nosso interior
Pra ele se manifestar
O Cristo ensinou o Amor;
Fazendo do Amor
o seu Reino na terra
Jesus cumpriu Sua missão,
Carregando Cristo com Ele,
O Amor tomou conta do Seu coração
Faça você também assim,
Espargindo Amor com toda emoção;
Autor: Elcínio Cavalheiro